Rastreamento do câncer do colo do útero: entenda as novas diretrizes que incluem o teste molecular de HPV
- Michele Patrícia Rode
- 22 de jul.
- 5 min de leitura
Entenda como e por que o teste molecular de HPV substitui a citologia (Papanicolau) no rastreamento do câncer do colo do útero.

Por Michele Rode
Farmacêutica, Doutora em Farmácia pela UFSC e Product Manager na BiomeHub.
Neste postblog será abordado:

O câncer do colo do útero é uma doença evitável quando diagnosticada precocemente, e os testes de rastreamento desempenham um papel essencial nesse processo. Eles são usados para detectar alterações no colo do útero antes do aparecimento de sintomas.
Tradicionalmente, o exame de citologia, também conhecido por Papanicolau ou preventivo, foi o principal método de detecção de alterações cervicais. No entanto, novas diretrizes recomendam o teste de DNA-HPV em substituição a citologia como método de rastreamento primário.
Neste post, você vai entender por que essa mudança representa um avanço importante para a saúde pública e como interpretar os resultados desse novo teste.
Por que o teste molecular de HPV é superior à citologia?
O teste molecular de HPV é superior em comparação a citologia (Papanicolau) na detecção de lesões precursoras do câncer do colo do útero. Enquanto a citologia identifica alterações celulares já visíveis, o teste de HPV detecta diretamente a presença do vírus de alto risco antes mesmo do surgimento de alterações celulares.
Principais vantagens do teste de HPV:
Maior sensibilidade: a sensibilidade do teste de HPV pode ser superior a 90-100%, enquanto a da colpocitologia é cerca de 47-60% no rastreamento primário. Além disso, o rastreamento baseado em teste de HPV também é superior na detecção de adenocarcinomas in situ, que são mais difíceis de detectar pela citologia.
Intervalos mais longos: o alto valor preditivo negativo do teste de HPV permite estender os intervalos de rastreamento para até cinco anos após um resultado negativo.
Como é feito o rastreamento com teste molecular de HPV?
A coleta para o teste molecular de HPV pode ser feita por profissional de saúde (médico ou enfermeiro) a partir do colo do útero (ecto e endocérvice) ou por autocoleta do canal vaginal, sem a necessidade de espéculo.
A sensibilidade e a especificidade da autocoleta são semelhantes às das amostras coletadas por profissionais, além disso a autocoleta é uma opção discreta, indolor e rápida.
A possibilidade de autocoleta pode aumentar a adesão ao rastreamento em até quatro vezes, especialmente em populações vulneráveis ou com dificuldades de acesso. A autocoleta é uma porta para o cuidado, especialmente para quem não realiza consultas ginecológicas regulares, removendo barreiras de vergonha e insegurança.
As novas diretrizes recomendam o início do rastreamento com testes de DNA-HPV oncogênico a partir dos 25 anos. Não é recomendado o rastreamento antes dos 25 anos, pois a prevalência de infecções transitórias por HPV é mais alta, não sendo recomendado tratamento. Para mulheres com risco padrão é recomendado encerrar o rastreamento aos 60 anos, desde que o último teste seja negativo e haja um histórico de rastreamento recente adequado.
Como interpretar o resultado do teste de HPV?
O fluxograma de rastreamento do câncer do colo do útero, conforme as diretrizes brasileiras mais recentes, envolve uma série de etapas dependendo do resultado do teste de DNA-HPV oncogênico.
Para mulheres com risco padrão:
Se o resultado for negativo (HPV de alto risco não detectado) a recomendação é repetir o teste de DNA-HPV oncogênico em 5 anos.
Se o resultado for positivo (HPV de alto risco detectado) a recomendação depende do genótipo do HPV:
Se detectar HPV 16 e/ou 18 é recomendado encaminhamento imediato para colposcopia.
Se a doença cervical estiver presente o profissional deve considerar conduta de tratamento específica.
Se for normal o seguimento deve incluir um novo teste de HPV em 1 ano.
Se detectar outros tipos de HPV oncogênicos (HPV 26, 31, 33, 35, 39, 45, 51, 53, 52, 56, 58, 59, 66, 68, 73 e 82) é recomendado realizar citologia.
Se a citologia for alterada ou insatisfatória a paciente deve ser encaminhada para colposcopia.
Se a citologia for negativa o seguimento deve incluir um novo teste de HPV em 1 ano.
Estratégias globais e do Brasil para eliminação do câncer do colo do útero
A eliminação do câncer do colo do útero é uma estratégia global definida em 2020 pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Para isso, foram estabelecidas 3 metas para reduzir a incidência do câncer do colo do útero para 4 casos por 100.000 mulheres/ano até 2030. As metas são conhecidas como 90-70-90:
90% das meninas vacinadas contra o HPV até os 15 anos de idade.
70% das mulheres rastreadas com um teste molecular para detecção de HPV oncogênico aos 35 e novamente aos 45 anos de idade.
90% das mulheres identificadas com lesões precursoras ou câncer do colo do útero recebendo tratamento.
No Brasil, o câncer do colo do útero é um desafio importante, pois é a terceira causa de câncer em mulheres e a quarta causa de morte por câncer em mulheres. Estima-se que, para cada ano do triênio 2023-2025, o risco é de 15,38 casos por 100.000 mulheres.
Além disso, cerca de 80% dos casos são diagnosticados em estágios avançados, pois o modelo de rastreamento predominante no Brasil é oportunístico, ou seja, a mulher realiza o exame por demanda própria ou quando já está em uma consulta por outros motivos de saúde. Esse tipo de rastreamento resulta em baixa cobertura e exames repetidos excessivamente nas mesmas mulheres, enquanto outras permanecem sem rastreamento.
Porém, há esforços do Brasil para atingir as metas da OMS. O Ministério da Saúde em conjunto com a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias (Conitec), está atualizando as Diretrizes Brasileiras para o Rastreamento do Câncer do Colo do Útero, incorporando os testes moleculares para detecção de HPV oncogênico no Sistema Único de Saúde (SUS).
Qual o impacto da microbiota vaginal?
Uma microbiota vaginal ideal é dominada por Lactobacillus, bactérias benéficas que mantêm o pH vaginal adequado, produzem moléculas antimicrobianas e fortalecem o sistema imune, protegendo contra infecções. A microbiota vaginal desequilibrada aumenta a suscetibilidade a Infecções Sexualmente Transmissíveis (IST), incluindo o HPV. Por exemplo, a Vaginose Bacteriana, um desequilíbrio comum da microbiota, está associada ao risco aumentado de infecções por HPV e de Neoplasia Intraepitelial Cervical (NIC).
A análise da microbiota vaginal pode fornecer informações importantes para um tratamento mais assertivo e individualizado. A análise da composição da microbiota vaginal e genotipagem do HPV podem ser feitas através do sequenciamento de DNA, como no exame BIOfeme Plus.
Ficou com alguma dúvida? Nossa equipe está aqui para ajudar! Entre em contato conosco e receba a ajuda que precisa.
Referências:
Diretrizes Brasileiras para o Rastreamento do Câncer do Colo do Útero: Parte I - Rastreamento organizado utilizando testes moleculares para detecção de DNA-HPV oncogênico. – Brasília : Ministério da Saúde, 2024.
Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas para Atenção Integral às Pessoas com Infecções Sexualmente Transmissíveis – IST [recurso eletrônico] / Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde, Departamento de Doenças de Condições Crônicas e Infecções Sexualmente Transmissíveis. – Brasília : Ministério da Saúde, 2022.
WHO guideline for screening and treatment of cervical pre-cancer lesions for cervical cancer prevention, second edition. Geneva: World Health Organization; 2021.
Global strategy to accelerate the elimination of cervical cancer as a public health problem. Geneva: World Health Organization; 2020.
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